«(...) porque nem o livro nem a areia têm princípio nem fim»[1]
Numa página do Livro de Areia vi a paisagem mais bela e angustiante. Ao recordá-la, fiquei na dúvida se seria a reprodução de uma fotografia ou de um desenho. Procurei a Imagem entre as páginas infinitas do livro mas não a voltei a ver. Talvez porque o livro é infinito e não seja possível voltar à mesma página. Talvez porque o sonhei, ou o li num conto de Borges. Talvez nunca o tenha segurado entre as mãos, talvez por ser de areia.
Mas a Imagem existe e atormenta-me. Como a forma encontrada na nuvem, ela não se deixa fixar. Talvez porque me tenha aparecido num sonho, e os sonhos esbatem-se pela manhã. Ainda que a tenha visto, também a memória me trai e a transforma cada vez que quero recordar. Quanto mais a evoco, mais a imagino.
Se a sonhei, a Imagem é só minha. Talvez a mais bela que criei. Talvez a mais importante. Talvez porque me escapa.
Footnotes
^ In BORGES, Jorge Luís. (1983). O Livro de Areia. Lisboa: Editorial Estampa, p.127.