Se a verdade acerca do mundo existir, será forçosamente não-humana – Joseph Brodsky
Uma grande parte da paisagem é espargida com artefactos de linearidade. Inscrições de transmissões humanas, codificadas ou não, demarcam fronteiras, dependências electro-materialistas e sistemas de comunicação rádio-teológicos. Alguns pontos talvez sejam ligados por linhas visíveis de cabos e conjuntos invisíveis de sinais transmitidos por via de redes tecno-telepáticas. Físicos em toda a sua aparência, estes artefactos revelam os mundos paralelos da modernidade e ainda assim permanecem isolados daquilo que os circunda, destacando-se como figuras escultóricas que rasgam adentro a paisagem aberta. Como estruturas em si e para si mesmas, podem ser intrusivas e deslocadas do lugar. E se a obsolescência do seu propósito for decidida por factores inteiramente desligados da sua localização, serão largadas às intempéries, ocupadas por vegetação ou até recicladas pelo seu valor material.
Mas existem alguns como eu que vêem os tótemes de linearidade como instrumentos de fabulação de potencial sónico, objectos que «dão voz» às forças do mundo meteorológico, insinuando a relação onde se deparam. Com as ferramentas do ofício, os seus rumores poderão por vezes ser escutados, gravados e tocados para os ouvidos descobertos, indo muito além da intenção significativa planeada pelos seus criadores. Ainda que muitos destes tótemes não expressem uma presença audível, os seus campos electro-magnéticos estendem as suas pegadas para lá do alcance quotidiano do perceptível ou sentido, dentro do éter do desconhecido. Documentar os métodos muitas vezes aleatórios ou acidentais com que os tótemes de linearidade foram construídos em relação ao seu contexto, é uma tentativa de dar uma perspectiva alternativa e sublinhar o impacto do determinismo infrastrutural num mundo, de outra forma, não-linear. É também um exercício no imaginário, uma projecção paradoxal do que poderia ser, para alguém que condicionalmente é treinado para ouvir o mundo para além dos seus significantes visuais predominantes.
A minha documentação destes «tótemes» não começou como uma recolha intencional de sons e imagens, mas emergiu como um tema, depois de anos, de incontáveis horas a procurar artefactos residuais de estruturas humanas impostas à paisagem. Como em qualquer investigação, a certa altura é natural perguntar o que é que realmente estou a ouvir nesses sons que capturo, muitos deles inaudíveis ao ouvido desapetrechado. Através de proximidade e contacto físico, tornamo-nos conscientes das ressonâncias que são mais vezes sentidas do que escutadas. Induzidos pelas forças do mundo meteorológico, os sons variam de sussurros e rumores harmónicos a ecos estridentes de servidão social, oferecendo-nos um carácter mais potente do que aquele que os seus criadores alguma vez pretenderam. Que poderá este carácter representar senão o potencial animado dos tótemes que se vivificam, expressando o seu ser material em resposta às condições naquilo que os rodeia. Tais expressões propagam-se indefinidamente num sistema aberto, criando dúvidas acerca do seu status isolado de objecto inerte. Mesmo neste preciso momento, ao leres isto, os tótemes aqui fotografados estarão a cantar, a cintilar e a vibrar ao vento, neve e chuva que continuamente moldam a terra. O silenciar do tótem acontecerá apenas com a sua eventual remoção ou destruição.
4 séries de gravações sonoras e 4 fotografias efectuadas entre 2012 e 2016.
John Grzinich - Comm Tower Wire
John Grzinich - Iceland Fence
John Grzinich - Snow on Wire
John Grzinich - Telephone Wires