Anos de chumbo, Anselm Kiefer

Anos de chumbo, Anselm Kiefer

O Centre Pompidou apresenta uma retrospectiva do artista alemão Anselm Kiefer com 150 obras que datam do fim dos anos 60 aos dias de hoje. Com salas temáticas que correspondem também a coordenadas espacio-temporais específicas da sua obra, a mostra inclui na galeria 1, pinturas, desenhos, vitrines, uma instalação e uma peça monumental colocada no hall do museu.

Retrospectiva de Anselm Kiefer, Sala das Vitrines, Centre Pompidou, Paris, 2015. © Mário Martins

A sua pintura, maioritariamente de grandes dimensões, é plasticamente densa, possui uma energia, uma intensidade visual e matérica que encontra correspondência com os conteúdos, as questões e conceitos abordados, que vão da história da Segunda Guerra Mundial, do nazismo, da cultura germânica à poética das ruínas, ao pensamento místico, esotérico, cabalístico, com uma forte presença de citações e referências filosóficas (Heidegger), literárias e poéticas (Paul Celan, Ingeborg Bachmann ou Jean Genet).

Vista da exposição retrospectiva de Anselm Kiefer, Centre Pompidou, Paris, 2015. © Mário Martins

Poderosa é a instalação monumental, edificação de seis contentores marítimos chapeados, com 3 pisos, que pode ser visitada no hall do museu, através de escadas em caracol, subindo e descendo do rés do chão ao último piso. A sua referência é «Fausto» de Goethe, pela sugestão de um duplo movimento de subida às alturas e descida ao abismo, presente no seu título – «Steigend, steigend, sinke nieder/En montant, en montant vers les hauteurs, enforce-toi dans l’abîme».

Anselm Kiefer, vista de «Steigend, steigend, sinke nieder/En montant, en montant vers les hauteurs, enforce-toi dans l’abîme», Centre Pompidou, Paris, 2015. © Mário Martins

No seu interior, ao centro, encontram-se bobines de filme e uma cascata de faixas/rolos de chumbo que em baixo mergulham num tanque de água lamacenta.

Anselm Kiefer, vista de «Steigend, steigend, sinke nieder/En montant, en montant vers les hauteurs, enforce-toi dans l’abîme», Centre Pompidou, Paris, 2015. © Mário Martins

Com colagens de fotografias a preto e branco, 100 000 ao todo, pertencentes ao arquivo pessoal do artista, como se fossem fotogramas e sequências de filmes, são a antítese do filme em celulóide já que, sendo de chumbo, não podem ser atravessadas pela luz. Neste espaço, a transparência dá lugar à opacidade e a introspecção sobrepõe-se à projecção.
A exposição está aberta no Centre Pompidou até 18 de Abril. SVJ

On Being an Angel

On Being an Angel

A exposição «Francesca Woodman. On Being an Angel», no FOAM - Fotografiemuseum, organizada pelo  Moderna Museet de Estocolmo em colaboração com o Estate of Francesca Woodman apresenta 102 fotografias, a maior parte impressões em gelatina e prata e seis vídeos.

Francesca Woodman, «On Being an Angel 1, Providence, Rhode Island», 1977. © Betty and George Woodman

A fotografia de Francesca Woodman explora questões de identidade e de género no âmbito da auto-representação, utilizando o seu próprio corpo. Em ambientes interiores fechados e decadentes, o seu corpo, integralmente nu ou parcialmente escondido, parece fundir-se com o espaço em volta, rodeado de objectos dispersos. As suas fotografias criam atmosferas inquietantes.

Francesca Woodman, «From Space 2, Providence, Rhode Island» 1976. © Betty and George Woodman

Mesmo quando as fotografias mostram outras pessoas, elas funcionam como um duplo da artista. Produzidas em séries temáticas, os seus trabalhos fotográficos relacionam-se com adereços, lugares e situações. Ao combinar performance, actuação e auto-exposição, as fotografias de Woodman são muitas vezes perturbadoras, ocultam ou encriptam o que pretendem transmitir, não mostram toda a verdade.

Francesca Woodman, «About Being My Model, Providence, Rhode Island», 1976. © George and Betty Woodman

Francesca Woodman cresceu em Denver, Colorado, numa família de artistas e começou a fotografar durante a adolescência. Com 13 anos tirou o seu primeiro auto-retrato. De 1975 a 1978, estudou na Rhode Island School of Design, recebendo uma bolsa para continuar os seus estudos em Roma.

Francesca Woodman, «Self-deceit 1, Rome, Italy», 1978. © Betty and George Woodman

Realizou aí a sua primeira exposição individual numa livraria e galeria especializada em futurismo e surrealismo. A maior parte do seu trabalho conhecido, cerca de 800 fotografias, foi realizada em Itália e Nova Iorque, cidade onde viveu entre 1979 e 1981, data da sua morte, por suicídio, aos 22 anos. Desde 1986, o seu trabalho tem sido exposto na Europa e nos Estados Unidos, sendo objecto de inúmeros estudos críticos.

Francesca Woodman, «Untitled MacDowell Colony, Peterborough, New Hampshire», 1980. © George and Betty Woodman

Cinco anos após a sua morte, no Wellesley College Museum, em Massachusetts, a sua obra foi exposta pela primeira vez nos Estados Unidos. Na altura, foi editado um catálogo com textos de Rosalind Krauss e Abigail Solomon-Godeau. Na Europa, a primeira exposição dedicada à sua obra ocorreu na Fondation Cartier pour l'Art Contemporain, Paris em 1998 e, em 1999, no Centro Cultural de Belém, em Lisboa. Mais recentemente, o Museum of Modern Art, San Francisco realizou uma grande exposição em 2010-2011, que posteriormente passou pelo Solomon R. Guggenheim Museum, em Nova Iorque, em 2012.

Francesca Woodman, «Untitled, Rome, Italy» 1977-79. © Betty and George Woodman


A retrospectiva «Francesca Woodman. On Being an Angel» é exibida no FOAM, Amesterdão, até 9 de Março de 2016. MM

Qui a peur des femmes photographes?

Qui a peur des femmes photographes?

O Musée d’Orsay e o Musée de l’Orangerie apresentam a exposição «Qui a peur des femmes photographes?». O objectivo é mostrar a intervenção das mulheres no campo da fotografia evidenciando o que o seu trabalho tem de característico e excepcional nos seus contextos históricos e socioculturais. Não se trata porém de uma história da fotografia feminina ou «no feminino» mas sim de demonstrar como algumas mulheres atingiram um grau elevado de mestria e competência em vários domínios da fotografia, tendo tido um papel importante na evolução do medium,  desde o seu início, afastando a ideia de que eram simples amadoras de classes sociais privilegiadas. Valorizando a investigação que foi efectuada e descobertas inéditas, esta exposição junta obras-primas conhecidas e desconhecidas.

Frances Benjamin Johnston (1864-1952), «Stairway of the Treasurer’s Residence: Students at Work (The Hampton Institute)», 1899-1900. © 2015. Imagem digital, The Museum of Modern Art, Nova Iorque / Scala, Florença

Na primeira parte que cobre de 1839 a 1919, patente no Musée de l’Orangerie, estão representadas mais de 70 fotógrafas, onde se incluem Anna Atkins, autora da primeira obra ilustrada de fotografias (1843-1853), Frances Benjamin Johnston e Christina Broom, pioneiras do fotojornalismo americano e inglês e outras artistas reconhecidas, como Julia Margaret Cameron e Gertrude Käsebier.

Frances Benjamin Johnston (1864-1952), «Autoportrait en travestie vélocipédiste», 1890-1900. © Library of Congress, Prints & Photographs Division [LC-USZ62-83111]

Desde meados do século XIX, a fotografia favoreceu a inserção das mulheres nos espaços de trocas, que constituíram as primeiras redes profissionais e amadoras da fotografia, já que havia restrições à sua participação noutros domínios artísticos, como a pintura e a escultura. Aproveitando uma fonte inédita de proventos comerciais ou como um meio de satisfazer um desejo de criatividade pessoal, foram-se afirmando como sujeitos pensantes. Algumas delas trabalharam isoladamente, outras em colectivos e para muitas delas a prática fotográfica tornou-se um instrumento de emancipação e subversão.

A exposição está construída de modo a pôr em destaque a exploração dos territórios do «feminino», nos registos do retrato e da ficção, por exemplo, no que toca à representação feminina do sentimento maternal, do casal e do mundo da infância, as questões da identidade sexual e da representação dos corpos masculinos e femininos.

Frances Benjamin Johnston (1864-1952), «Autoportrait dans l’atelier», c. 1896. © Library of Congress, Washington, Prints & Photographs Division [LC-USZ62-64301]

Sustentadas pela ideologia progressista da «New Woman» anglo-saxónica, as fotógrafas vão conquistando territórios até aí reservados aos homens, nos ateliers ou em reportagens, abordando questões das minorias sociais e étnicas, a luta pelos direitos cívicos das mulheres ou a representação dos acontecimentos da Primeira Guerra Mundial.

Christina Broom (1862-1939), «Jeunes suffragettes faisant la promotion de l’exposition de la Women’s Exhibition de Knightsbridge», Londres, Maio 1909. © Christina Broom/Museum of London

A segunda parte da exposição, no Musée d’Orsay, balizada entre 1918-1945, está organizada em três secções temáticas: «Le détournement  des codes» (Imogen Cunningham, Madame Yevonde, Aenne Biermann, Lee Miller, Dora Maar, Helen Levitt); «L’autoportrait et la mise en scène de soi» (Claude Cahun, Marta Astfalck-Vietz, Marianne Brandt, Gertrud Arndt, Elisabeth Hase, Ilse Bing); «La conquête des nouveaux marchés de l’image» (Germaine Krull, Margaret Bourke-White, Tina Modotti, Barbara Morgan, Gerda Taro, Dorothea Lange, Lola Alvarez-Bravo, etc.).

Neste período, as mulheres fotógrafas contribuem para a evolução da fotografia de muitas maneiras, incluindo a organização de exposições, a criação de escolas, a direcção de estúdios comerciais, a escrita de artigos e livros práticos e teóricos, além de, evidentemente, fazerem fotografia.

Margaret Bourke-White (1904-1971), «Self-portrait with camera». © Digital Image Museum Associates/ Los Angeles County Museum of Art (LACMA), Los Angeles/Art Resource NY/Scala, Florença

Mantendo as temáticas do período anterior, começam a subverter e transgredir os códigos artísticos e sociais, introduzindo um olhar crítico e distanciado sobre o seu estatuto e sobre as relações de dominação entre os sexos. A exposição do seu próprio corpo, o auto-questionamento, os jogos de máscaras e o esbatimento das identidades tornam-se temas predilectos.

Ruth Bernhard (1905-2006), «Embryo», 1934, impressão 1955-1960. Keith de Lellis Gallery, Nova Iorque. Reprodução autorizada por Ruth Bernhard Archive, Princeton University Art Museum. © Trustees Princeton University. Cortesia: Keith de Lellis Gallery, Nova Iorque

Os géneros reservados aos homens, como o nu e o erotismo, as máquinas, a velocidade e a arquitectura industrial, assim como o auto-retrato, como experiência estética, exploração dos sinais da feminilidade ou expressão de pertença profissional, manifestam a emergência de uma nova mulher. Estão ao lado deles no mundo político, no teatro de guerra, na reportagem e no jornalismo, na moda e na publicidade, na ilustração.

A exposição decorre até 24 de Janeiro de 2016 nos museus de l’Orangerie  e d’Orsay, com a participação da Library of Congress, Washington, D.C. MM

BRUNO ZHU

BRUNO ZHU

Bruno Zhu (1991) foi o vencedor do Prémio NOVO BANCO Revelação 2015, recebendo assim uma bolsa de produção para uma exposição individual que agora apresenta no Museu de Serralves, com curadoria de Filipa Loureiro e Ricardo Nicolau.
Simultaneamente, no FOAM – Fotografiemuseum Amsterdam, no espaço Foam 3h – um projecto em que curadores convidam jovens fotógrafos a realizar a sua  primeira exposição individual no museu com trabalhos que expandam os limites da fotografia – o artista apresenta a exposição «New Arrivals», em que transforma a biblioteca num espaço com outra leitura. A instalação combina e transporta motivos visuais do espaço privado para o público e vice-versa. Desta forma, Zhu explora a simbologia ambivalente da fotografia como superfície e objecto, representação e apropriação, dimensão tridimensional da imagem e a dimensão virtual, bidimensional, dos objectos.

Bruno Zhu, New Arrivals, 2015 © Bruno Zhu. Cortesia do artista e Jeanine Hofland, Amsterdão

O espaço expositivo é ocupado por imagens – representações de espelhos, tapetes, estantes, candeeiros e outras peças de mobiliário. Estes objectos-imagem, digitalizados e reproduzidos à escala original dos objectos, evocam e apresentam de modo crítico um circuito consumidor alternativo, criando um mundo transfigurado de funções fantasmagóricas.

Bruno Zhu, New Arrivals, 2015 © Bruno Zhu. Cortesia do artista e Jeanine Hofland, Amsterdão

A partir de catálogos e revistas mundanas, as imagens de mobiliário convidam o público para um mundo radiante e positivo, composto de representações da realidade, convocando-o para desfrutar de um admirável mundo novo, evidenciando a decoração como uma posição crítica para activar a reflexão pessoal.

Bruno Zhu, New Arrivals, 2015 © Bruno Zhu. Cortesia do artista e Jeanine Hofland, Amsterdão

Bruno Zhu é um artista português de ascendência chinesa, que estudou Design de Moda na Central Saint Martins de Londres. Actualmente vive em Amsterdão, onde frequenta o Mestrado em Belas-Artes no Sandberg Instituut.
A exposição de Serralves, pode ser vista até 31 de Janeiro. A instalação em Amesterdão está patente no Foam até 13 de Dezembro. MM

Abraham Cruzvillegas

Abraham Cruzvillegas

«Empty Lot» é o projecto do artista mexicano Abraham Cruzvillegas realizado no âmbito da nova série de projectos anuais patrocinados pela Hyundai na Turbine Hall da Tate Modern. Formada por duas plataformas triangulares escalonadas e apoiadas por andaimes,  a instalação de dimensão monumental é formada na sua zona superior por uma estrutura com 240 canteiros com 23 toneladas de terra retirada de parques e jardins da cidade.

Abraham Cruzvillegas, «Empty Lot». Hyundai Commission 2015. © Abraham Cruzvillegas. Fotografia: Andrew Dunkley © Tate 2015

Não sendo este um espaço destinado à produção e sem que o artista tenha plantado alguma espécie vegetal no solo, é bem possível que durante o período de exposição, brotem da terra cogumelos e pequenas plantas de sementes ou bolbos por influência de pontos de luz instalados e improvisados pelo artista a partir de materiais encontrados nas imediações da Tate.

Abraham Cruzvillegas, «Empty Lot». Hyundai Commission 2015. © Abraham Cruzvillegas. Fotografia: Andrew Dunkley © Tate 2015

Com esta peça Abraham Cruzvillegas deseja retratar a relação entre o espaço urbano e a natureza num dos locais mais movimentados, habitados e visitados da cidade, deixando em aberto a possibilidade de haver ou não transformações da peça ao longo da exposição. De resto, é esta imprevisibilidade que Cruzvillegas mais destaca neste projecto, desafiando os visitantes a ter esperança e convidando-os a acompanhar semanalmente o seu desenvolvimento. 

Abraham Cruzvillegas, «Empty Lot». Hyundai Commission 2015. © Abraham Cruzvillegas. Fotografia: Andrew Dunkley © Tate 2015

Cruzvillegas pertence a uma geração de artistas mexicanos que emerge na década de noventa e que desenvolveu um corpo de trabalho de natureza escultórica, baseado na auto-construção de peças com objectos maioritariamente encontrados no espaço onde vive e trabalha, na Cidade do México. O seu método de criação artística inspira-se sobretudo na forma como a geração dos seus pais, vinda da zona rural do México, se instalou nos anos 60 na capital, construindo as próprias casas em etapas, através da apropriação/reutilização de materiais e improvisação artesanal de soluções arquitectónicas. Para este projecto na Tate, Abraham Cruzvillegas, afirmou ter como referências principais as formas construtivistas de El Lissitsky e o trabalho do arquitecto Buckminster Fuller, com os seus desenhos e cúpulas formadas pela intersecção de elementos triangulares. SVJ